Quando A “Adoração” Protestante Não É Adoração

Alguns protestantes defendem suas liturgias comparando-as à sinagoga da época de Jesus. Eis aí o problema..
Jesus não poderia ter sido mais claro sobre a necessidade do culto: citando Deuteronômio 6,13, ele lembra ao tentador que "adorarás ao Senhor teu Deus, e só a ele prestarás culto" (Lucas 4,8). Mas, embora a maioria dos cristãos concorde com a necessidade de adorar a Deus, há enormes divergências sobre como adorá-Lo adequadamente.
Em vez do sacrifício da Missa, os protestantes inventaram novas cerimônias religiosos artificiais, criando, em última análise, muitas tradições de culto diferentes. Mas, por mais diferentes que sejam, a maioria deles tem uma coisa em comum. Como diz o liturgista protestante James White, "a maior parte do culto protestante, historicamente e atualmente, não fez da Eucaristia sua cerimônia central" e "quando a eucaristia é celebrada, muitas vezes é adicionada ao final (ou início) do culto dominical habitual".
O que essa rejeição da Eucaristia significa para a verdadeira adoração?
Vamos começar com as más notícias: o problema com boa parte do culto protestante não é que seja um culto malfeito. É que não é adoração de forma alguma. Não me refiro apenas às megaigrejas estereotipadas nas quais os pastores pregam clichês de autoajuda sob o verniz do cristianismo. Estou falando também de boa parte dos chamados cultos protestantes "tradicionais". Por exemplo, aqui está um proeminente pastor batista (1) falando sobre o privilégio que tem sido "pregar todos os domingos atrás de um dos púlpitos mais, senão o mais, influentes do século XX no mundo ocidental", e descrevendo o papel do púlpito na concepção batista de adoração:
Esse púlpito, como a maioria dos púlpitos na vida batista, fica no meio do edifício, no centro do palco, por assim dizer. Ele está lá para afirmar que o elemento central do culto batista é a pregação do livro de Deus ao povo de Deus. ... A proclamação, a pregação do evangelho, deve ser o elemento central do culto cristão. O sermão é a dinâmica central na experiência de culto. É o fulcro sobre o qual gira todo o culto. Tudo o que vem antes dele deve apontar para ele, e tudo o que vem depois dele deve dele emanar.
Isso poderia resultar em uma bela palestra religiosa, mas nada do que ele descreve ali é adoração. E é uma perda incalculável passar de igrejas construídas em torno do altar, onde Jesus Cristo está verdadeiramente presente e é oferecido ao Pai, para igrejas construídas em torno do púlpito, nas quais um pastor nos diz o que ele pensa ser a mensagem de Jesus.
Talvez isso pareça injusto. Alguns, como Barry Lietsch (2), da Universidade Biola, Califórina, EUA, responderiam (3) que os protestantes estão simplesmente seguindo o modelo das sinagogas judaicas: "Até hoje, o culto protestante deve sua importância à ênfase [das sinagogas] na oração, na leitura das Escrituras, no ensino, no envolvimento dos leigos e na liderança dos presbíteros". Certamente, existem algumas semelhanças óbvias entre o que se encontraria em muitas igrejas protestantes nas manhãs de domingo e o que se encontraria em uma sinagoga do primeiro século (ver Lucas 4,16-21; Atos 13, 15,27).
Mas o problema é que Jesus não considerava a leitura das Escrituras ou a pregação como adoração, ou mesmo oração. Se não vemos isso, é porque tendemos a confundir pregação, oração e adoração. Mas, para Jesus, essas são três coisas claramente distintas. Podemos dizer que pregar é falar sobre Deus, orar é falar com Deus e adorar é dar a Deus o que lhe é devido (sacrifício, honra divina, etc.). E para Jesus, essas três coisas eram feitas em três lugares diferentes.
A sinagoga é claramente um lugar para instrução religiosa e para pregação. Jesus proferiu o discurso do Pão da Vida "ensinando na sinagoga em Cafarnaum" (João 6,59). Portanto, é um lugar de ensino. Mas, claramente, não é um lugar de oração.
Hoje, as sinagogas são o local onde os fiéis judeus se reúnem para rezar, mas isso não era o caso (4) na época de Jesus. Há uma famosa sinagoga do século I em Jerusalém com uma inscrição no chão que descreve a sinagoga como um local para "ler a Lei e estudar os mandamentos, e como um albergue com quartos e instalações de água para atender às necessidades dos viajantes estrangeiros". Mas, como aponta o Rabino Reuven Hammer (5), "não há menção à oração". Ele afirma que "embora o argumento do silêncio nunca seja absoluto, as evidências são contundentes de que as sinagogas na época anterior à destruição do Segundo Templo eram principalmente locais para a disseminação do conhecimento da Torá em um nível popular, e que qualquer oração que ocorresse ali estava relacionada ao estudo ou era secundária a ele".
Afinal, não é como se o Novo Testamento fosse omisso sobre a sinagoga ou sobre a oração. Ambos são mencionados repetidamente. No entanto, nunca lemos sobre alguém rezando na sinagoga. Na verdade, é ainda mais extremo do que isso: a única vez em que a sinagoga é associada à oração, é Jesus dizendo para não rezar na sinagoga. Isso porque a sinagoga nos dias de Jesus era um lugar para negócios seculares e estudo das Escrituras, não um lugar de oração ou adoração.
Jesus proibiu a oração na sinagoga não porque achava que as sinagogas fossem lugares ruins. Ele as visitava semanalmente, indo "a todas as cidades e povoados ensinando em suas sinagogas e pregando o Evangelho do Reino" (Mateus 9,35). A sinagoga é um bom local de reunião e um ótimo lugar para encontrar uma multidão à qual você pode pregar a Boa Nova. Mas a implicação das palavras de Jesus em Mateus 6 é que "a sinagoga é um lugar público como uma esquina, não um lugar apropriado para rezar". Os fariseus e hipócritas não rezavam na sinagoga porque era uma casa de oração (não era); eles rezavam lá porque era um lugar público (como uma esquina) onde podiam ser vistos agindo piedosamente.
Isso é indispensável para compreender corretamente a adoração cristã. Não há nada de errado em se reunir para ler as Escrituras e discutir seu significado ou ouvir um especialista explicar o que elas significam. Isso pode ser uma ajuda importante em sua jornada espiritual; foi assim para Jesus, que tinha o costume de frequentar a sinagoga semanalmente (Lucas 4,16). Mas isso não pode satisfazer nossa necessidade espiritual de oração e, menos ainda, de adoração.
Autor: Joe Heschmeye
Original em Inglês: Catholic Answers
Notas:
(1) - Fonte: The Pastor's Guide to Leading and Living, O. S. Hawkins
(2) - Barry Liesch é o fundador do programa Worship Arts na Universidade Biola ( CA, EUA). Worship Arts, ou Artes de Adoração, é um termo que abrange diversas formas de expressão artística utilizadas no contexto da adoração cristã. Essas artes incluem música, dança, teatro, artes visuais e outras manifestações criativas que visam glorificar a Deus e enriquecer a experiência de culto. A prática de Worship Arts tem raízes profundas na tradição cristã, onde a adoração é vista como uma forma de se conectar com o divino e expressar a fé de maneira criativa e significativa.
(3) - Fonte: People in the Presence of God: Models and Directions for Worship, Barry Liesch.
(4) - Fonte: The Role of the Synagogue in the Aims of Jesus, Barry Liesch
(5) - Reuven Hammer (30 de junho de 1933 – 12 de agosto de 2019) foi um rabino conservador americano-israelense, estudioso da liturgia judaica, autor e palestrante nascido em Nova York. Ele foi um dos fundadores do movimento "Masorti" (conservador) em Israel e presidente da Assembleia Rabínica Internacional. Ele atuou por muitos anos como chefe do Masorti Beth Din em Israel. Escritor prolífico na imprensa israelense e internacional, ele era colunista regular da coluna "Tradition Today" do The Jerusalem Post.