Por Que Voltamos A Agostinho?

09/12/2023
Santo Agostinho em Seu Estudo, de Sandro Botticelli, c. 1490-1494 [Galeria Uffizi, Florença, Itália]
Santo Agostinho em Seu Estudo, de Sandro Botticelli, c. 1490-1494 [Galeria Uffizi, Florença, Itália]

Apesar do aumento de cristão não-denominacionais, as Confissões de Agostinho tendem a atrair leitores em idade universitária. Os cristãos geralmente recorrem a Agostinho em tempos difíceis, intuindo que ele provavelmente oferece orientação profética para nós em algum lugar de sua volumosa obra. Mas não são apenas os cristãos que encontram algo com que se conectar nas Confissões. Meus alunos seculares e religiosos sempre apontam esse texto como um dos dois textos mais úteis que lhes são designados em um curso de Grandes Livros. O outro é a Ética a Nicômaco, de Aristóteles.

Por que Agostinho? Talvez porque Agostinho nos convida a lutar contra limitações e anseios que a modernidade tende a ignorar. Nossa maior limitação é a morte, e desejamos o que não morre. Mais precisamente, de acordo com Agostinho, desejamos glorificar o que é mais completo do que nós mesmos: "E quer louvar-te o homem, esta parcela de tua criação". O modo de vida moderno visa melhorar nossas circunstâncias materiais - "ter colocado nas mãos dos homens… as suas próprias fortunas … a ampliação do seu poder sobre a natureza", como Bacon escreve no Novum Organum.

Muitos de meus alunos sentem que o projeto tecnológico moderno é, em última análise, insatisfatório. Agostinho nos dá motivos para suspeitar que o projeto desestabilizou nossa psique, levando-nos a uma atividade cada vez mais autodestrutiva, na esperança de que possamos nos dar um amanhã fundamentalmente melhor.

Elon Musk, admirado por muitos de meus alunos seculares que simpatizam com Agostinho, recentemente descreveu sua alma como uma tempestade infeliz. É provável que os esforços de Musk em busca de aliviar a condição humana (páginas 111-132), transformando radicalmente nossa natureza, levem à felicidade? Ou a manifestação dessa inquietação tecnológica é uma fonte de dor maior? Não é por acaso que os ídolos do Vale do Silício dependem de drogas psicodélicas. Os deuses são escravos de suas próprias criações - e de suas próprias esperanças fantásticas de evitar a infelicidade alterando a consciência humana.

Talvez surpreendentemente, muitos dos não-denominacionais em minha sala de aula estão tentando decidir se é a religião ou a tecnologia que é realmente o opiáceo das massas. Eles acham revigorante o fato de Agostinho desafiá-los a enfrentar os anseios profundos de suas almas em vez de alimentar a ilusão de que a vida de distração é uma vida boa.

Um de meus alunos que não frequenta a igreja me disse que a leitura das Confissões o impossibilitou de ser materialista. Isso não se deveu a um argumento claramente apologético. Em vez disso, esse aluno descobriu em Confissões razões para suspeitar que a ciência e a tecnologia modernas são guias insuficientes para a maneira como se deve viver.

O mundo moderno baseia-se na premissa de que podemos encontrar a felicidade sem referência a uma ordem superior e sem buscar "as coisas lá do alto". (Colossenses 3,1) Hobbes e Locke - cada um à sua maneira - afirmam que a sobrevivência acompanhada de um pouco de prazer durante o dia e um pouco de prazer à noite satisfaz o coração. E Montesquieu afirma que qualquer satisfação que a religião proporcione pode ser encontrada com a mesma facilidade em nossos passatempos (ou, em termos modernos, nos filmes disponíveis em streaming). De acordo com essa visão, a religião não é essencial.

Os filósofos da modernidade afirmam que encontramos paz pessoal e social quando subordinamos nossas inclinações religiosas ao prazer privado. Eles argumentam que podemos ignorar confortavelmente a religião porque, na verdade, não precisamos de nada além de bens materiais. Devemos mudar de assunto sempre que afirmações potencialmente incômodas sobre crenças surgirem em uma conversa (não fale sobre religião no Natal!). Mas essa tentativa de organizar a sociedade somente em torno da prosperidade material não consegue satisfazer o coração humano. Em vez disso, ela resulta em um escapismo miserável - ou pior.

De forma agostiniana, Pascal pesquisa a alma moderna e percebe que os passatempos e o entretenimento não conseguem substituir nosso desejo pelo eterno. Como ele argumenta, a prosperidade apenas nos "desvia" do pensamento sobre nossas almas. Dizemos a nós mesmos que queremos uma nova experiência ou emoção porque queremos aproveitá-la.

Mas a verdade é que queremos mais a novidade do que a coisa específica. Não podemos tolerar a quietude porque isso nos forçaria a reconhecer nossas almas inquietas. O anseio pelo que perdura nos toca tão profundamente que precisamos de distração constante para viver sem pensar nisso. Mesmo assim, não podemos remover nosso desejo mais profundo. Só podemos elevá-lo ou pervertê-lo, seja imaginando o divino ou perseguindo uma "busca sem alegria pela alegria".

Em um sermão de Páscoa, Agostinho ensina aos recém-batizados que o cristianismo é resumido pelo verso litúrgico, Sursum corda ("Corações ao alto!"): "Essa é toda a vida dos verdadeiros cristãos, 'Corações ao alto!'; não dos cristãos apenas no nome, mas dos cristãos na realidade e na verdade. O que significa 'corações ao alto'? Esperar em Deus, não em si mesmo. Se ele não o tivesse elevado, esse coração permaneceria na terra."

Talvez voltemos a Agostinho porque ele nos revela o que já sentimos ser verdade, que a vida é mais do que a carne. Agostinho frequentemente cita Gálatas 5,17: "Porque os desejos da carne se opõem aos do Espírito, e estes aos da carne". Ele não entende que isso significa que o corpo é mau, mas que a vida vivida totalmente para o corpo não vale a pena ser vivida.

Agostinho evangeliza e disciplina os anseios espirituais que a modernidade menospreza. Ele prega que Cristo dá o que "o próprio espírito do homem não conhece", apontando para uma felicidade na graça que responde (e excede) os anseios da natureza.

Dessa forma, Agostinho nos ensina um modo de responder à modernidade fazendo perguntas sobre a melhor disposição da alma e do corpo. Descobrimos essas questões investigando a nós mesmos, não tentando (em vão) expandir o poder sobre o cosmos. Agostinho nos leva a ver que não podemos ter alegria nem usar bem os bens desta vida a menos que passemos de uma inquietação pelas coisas temporais para uma inquietação pelo divino, de uma vida de alimentar porcos para uma vida que condiz com homens e mulheres maduros que "buscam sempre a Sua face".

Autor: Michael R. Gonzalez

Original em inglês: The Catholic Thing