O Espírito Santo E Nós

22/05/2022
Os Defensores da Eucaristia por Peter Paul Rubens, c. 1625 [Museu do Prado, Madri]. Santo Ambrósio, Santo Agostinho, São Gregório Magno e Santa Clara de Assis são vistos à esquerda de São Tomás de Aquino, e São Norberto e São Jerônimo à direita. Tomás fala com autoridade sobre a Eucaristia, por inspiração do Espírito Santo (acima).
Os Defensores da Eucaristia por Peter Paul Rubens, c. 1625 [Museu do Prado, Madri]. Santo Ambrósio, Santo Agostinho, São Gregório Magno e Santa Clara de Assis são vistos à esquerda de São Tomás de Aquino, e São Norberto e São Jerônimo à direita. Tomás fala com autoridade sobre a Eucaristia, por inspiração do Espírito Santo (acima).

Em Atos 15,28, os Apóstolos escrevem aos cristãos em Antioquia, "Com efeito, pareceu bem ao Espírito Santo e a nós não vos impor outro peso além do seguinte indispensável" (Atos 15, 28). Parece que eles estão se colocando em pé de igualdade com o Espírito Santo, como se a aprovação deles fosse necessária para Sua decisão. É como o padre que começa seu sermão: "Nosso Senhor disse certa vez, e acho que ele está certo. . ."

Pareceu bem ao Espírito Santo e a nós. Embora seja um versículo curioso, é extraordinariamente importante como uma declaração sobre a autoridade de ensino da Igreja e, de fato, sobre a autoridade de todos os cristãos. Isso não significa que o Espírito Santo precisava da aprovação dos Apóstolos, mas que Ele próprio estava falando por meio dos Apóstolos. Um desacordo sobre o Evangelho havia surgido em Antioquia. Deus não deixou Seu povo em dúvida, mas guiou a Igreja pelo Espírito Santo e os Apóstolos, com a autoridade de Seu ensino.

Nossa cultura está sofrendo uma extraordinária crise de autoridade. Não há instituição que não tenha perdido alguma ou toda a credibilidade devido ao abuso de autoridade por parte de um líder ou líderes. Esses líderes usaram sua autoridade para o que não deveria ser feito e deixaram de usá-la para o que deveria ser feito. Pior ainda, as instâncias específicas desse abuso levaram alguns a rejeitar o próprio princípio da autoridade.

Acontece que autoridade é uma coisa muito importante para nós, seres contingentes. Não somos tão autônomos quanto achamos. Nós teremos algum tipo de autoridade. Só porque rejeitamos uma autoridade não significa que não reconheceremos uma outra. Quando fechamos a porta para uma autoridade legítima, mas abusiva, alguma outra entrará pela janela.

Portanto, o perigo não é que as pessoas ficarão à deriva sem qualquer orientação . É que as pessoas vão se ligar a autoridades caprichosas e prejudiciais. Para estabilidade e orientação, elas procurarão um governo absolutista, ou os "especialistas", ou a mídia, ou "ciência", ou a economia, ou a gangue e assim por diante. Todo "livre pensador", que agora escreve ou fala contra "o homem", uma vez cedeu à autoridade de seu professor para aprender a ler e escrever.

A cena dos Atos dos Apóstolos é o primeiro exemplo do magistério da Igreja, ou de sua autoridade de ensino. Seu magistério vem do que é comumente conhecido como o Concílio de Jerusalém, que foi convocado para discutir se a Lei Mosaica (e a circuncisão em particular) que ainda obrigava os cristãos. Este foi um ponto de virada para a Igreja: ou eles seriam obrigados a manter toda a Lei Mosaica ou não.

O exercício de autoridade dos apóstolos foi saudado com entusiasmo pelos cristãos em Antioquia (talvez por homens em particular): "alegraram-se pelo consolo que trazia". (Atos 15,31) Desnecessário dizer que não é assim que nós modernos recebemos os ensinamentos oficiais. Não, nós os vemos como uma imposição, uma restrição ao nosso pensamento.

De fato, o magistério da Igreja está a serviço do pensamento. A Igreja ensina com autoridade não para escravizar os cristãos mas para libertá-los do erro e da divisão. Ao ensinar com autoridade sobre a Lei Mosaica, o Concílio de Jerusalém libertou os primeiros cristãos da escravidão dos judaizantes e protegeu a Igreja nascente da divisão.

Pareceu bem ao Espírito Santo e a nós. Este versículo revela o cumprimento do que nosso Senhor promete no Evangelho de hoje: "Mas o Paráclito, o Espírito Santo que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará tudo e vos recordará tudo o que eu vos disse." (Jo 14, 26).

É o próprio Espírito que ensina os Apóstolos em Jerusalém e que, por meio deles, ensina aos demais. O Espírito faz com que eles se lembrem de tudo o que o Senhor lhes disse e assim faz da Igreja uma instituição que lembra, o corpo que O torna presente e também os Seus ensinamentos.

Pareceu bem ao Espírito Santo e a nós. Estas palavras aplicam-se de maneira única aos Apóstolos e seus sucessores, os bispos. De maneira diferente, elas se aplicam também a todos os cristãos.

Primeiro, elas nos pedem para perguntar qual autoridade seguimos. O que molda nossas vidas? É o Evangelho de Cristo como o conhecemos por meio da Igreja ou alguma ideologia mundana? Haverá uma autoridade em nossas vidas. Será ou o Espírito falando por meio da Igreja, ou alguma força no mundo. Ou recebemos os ensinamentos oficiais da Igreja com prazer, ou os rejeitamos e nos tornamos escravos de outro poder.

Segundo, nossos pensamentos, palavras e ações devem ser uma decisão do Espírito Santo e nossa. Isso requer que sejamos receptivos e atentos às solicitações do Espírito. O Espírito Santo nos é dado não para que possamos viver nossas próprias vidas com sua ajuda mas para que possamos pensar, falar e agir como Cristo. Ou melhor, para que possamos dizer com São Paulo: "Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim". (Gl 2,20) O Espírito é dado para ser nosso advogado e guia. Ele deve encontrar em nós uma resposta generosa e obediente aos seus sussurros.

Esta unidade da Igreja com o Espírito torna seus membros testemunhas oficiais de Cristo. Como vemos nos santos, a docilidade aos sussurros do Espírito - a habilidade de dizer, pareceu bem ao Espírito Santo e a nós - dá a um mero homem ou mulher a autoridade moral que nenhum mandato mundano pode conferir.

Autor: Pe. Paul D. Scalia

Original em inglês: The Catholic Thing