O Diaconato Transitório É Parte Integrante Da Igreja Católica
O diaconato transitório ainda é necessário? Em outras palavras, é necessário que um sacerdote seja ordenado diácono antes de ser ordenado ao sacerdócio? No recente ensaio The Catholic Church doesn't need transitional deacons (N.T.: A Igreja Católica não precisa de diáconos transitórios) publicado pela revista jesuita America Magazine, seu autor, o diácono William T. Ditewig, argumenta com um retumbante não. De acordo com ele, o passo diaconal no caminho para o sacerdócio não é mais necessário ou benéfico. Entretanto, eu discordo. A reconfiguração do diaconato deve ser feita com mais cautela e cuidado teológico.
Descontinuidade ou reforma?
Nas conversas sobre a possível reforma do diaconato, conforme expressas pelos Cardeais McElroy e Cupich e detalhadas pelo Diácono Ditewig, encontramos uma encruzilhada teológica fundamental: A Igreja deve adotar uma hermenêutica de descontinuidade, cortando o caminho sequencial tradicional para o sacerdócio em favor de um diaconato reconfigurado? Ou, em vez disso, ela deve ver esses desenvolvimentos por meio de uma hermenêutica de reforma articulada pelo Papa Bento XVI?
O Papa Bento XVI adverte sobre os perigos inerentes a uma hermenêutica de descontinuidade, que ele descreve como uma "ruptura" com o passado. Essa abordagem não apenas interpreta erroneamente a natureza das reformas eclesiais, mas também corre o risco de uma divisão dentro da Igreja. Ela ameaça uma fissura entre a Igreja pré-conciliar e a pós-conciliar. Os proponentes da descontinuidade argumentam que o Concílio Vaticano II e as tradições de longa data, como o diaconato transitório, não transmitem totalmente o espírito de renovação eclesial previsto pela Igreja moderna. Eles defendem um afastamento radical dessas tradições, dizendo que essa ruptura é necessária para enfrentar os desafios pastorais e teológicos contemporâneos.
Em contraste, o Papa Bento XVI defende uma hermenêutica da reforma, enfatizando a renovação dentro da continuidade da vida e da tradição da Igreja. Esta abordagem respeita a rica herança da Igreja, ao mesmo tempo que permite o desenvolvimento orgânico, alinhando-se estreitamente com o verdadeiro espírito do Concílio Vaticano II. A hermenêutica da reforma não rejeita os ensinamentos do passado, mas procura compreendê-los e integrá-los no contexto vivo da jornada da Igreja através da história.
Reconfigurando o diaconato
A discussão em torno do diaconado, particularmente a sua necessidade como fase de transição para o sacerdócio, deve ser abordada com a hermenêutica da reforma. Esta perspectiva permite-nos apreciar o papel integral do diaconado na vida sacramental da Igreja e o seu desenvolvimento histórico como parte de um continuum e não como uma relíquia que impede a modernização.
Ao abraçar esta abordagem, reconhecemos que qualquer desenvolvimento na compreensão e prática do diaconado não deve simplesmente descartar a ordem estabelecida. Em vez disso, deveria reflectir um compromisso mais profundo com os fundamentos doutrinários da Igreja e um compromisso de promover uma realização mais profunda destas ordens na vida eclesial contemporânea.
Assim, para responder aos apelos do Cardeal McElroy, do Cardeal Cupich e do Diácono Ditewig para "reconfigurar" o diaconato, é crucial discernir se essas reformas realmente refletem um desenvolvimento genuíno da compreensão da Igreja sobre o ministério ou se elas surgem de uma busca ideológica por novidades que correm o risco de desorientar os fiéis e interromper a coerência sacramental mantida pela Igreja por séculos.
A experiência prática e uma teologia do ministério
As preocupações do diácono Ditewig não são todas teóricas. Ele se aprofunda nas dimensões práticas do diaconato de transição, enfatizando os benefícios experimentais que ele proporciona para aqueles que estão se preparando para a ordenação sacerdotal. Ele discute como isso tem proporcionado historicamente aos seminaristas uma experiência ministerial prática antes de assumirem todas as responsabilidades do sacerdócio.
O argumento do Diácono Ditewig, no entanto, adota predominantemente uma perspectiva sociológica, analisando o papel e a função do diaconato em termos de sua utilidade e eficácia na preparação de candidatos ao sacerdócio. Essa abordagem tende a ver o diaconato por meio de uma lente de funcionalidade e pragmatismo. Ela se concentra no que os diáconos fazem - suas tarefas e papéis - em vez de se concentrar em quem eles são no sentido ontológico: Compartilhadores da identidade de Cristo, o Servo. A falta das Escrituras e de referências à Tradição e ao Magistério na discussão do Diácono Ditewig revela a lacuna entre a abordagem teológica do diaconato e sua análise mais moderna e funcional.
Para tratar das lacunas na abordagem de Ditewig, é preciso explorar como o diaconato, como um sinal sacramental, participa exclusivamente do mistério da salvação e como essa identidade deve informar e transformar a execução prática do ministério do diácono. Também seria necessário um retorno às fontes patrísticas e conciliares que articulam o papel do diácono na vida da Igreja, assegurando que qualquer discussão sobre a evolução ou "revisão" do diaconato permaneça ancorada em uma profunda compreensão de sua natureza sagrada.
Transitório x permanente
O Diácono Ditewig critica os termos "transitório" e "permanente" comumente usados para descrever os diáconos. Ele argumenta que esses rótulos são enganosos e reducionistas, sugerindo que eles criam uma divisão na única Ordem dos Diáconos. O Diácono Ditewig enfatiza que todos os diáconos compartilham a mesma graça sacramental transmitida pela ordenação, independentemente de serem eventualmente chamados ao sacerdócio ou permanecerem diáconos permanentemente.
Embora a crítica da terminologia do Diácono Ditewig seja convincente e se alinhe com uma compreensão mais sacramental do diaconado, a sua caracterização do diaconado transicional como um "aprendizado" também fica aquém de reconhecer o pleno significado teológico e ontológico desta ordem. Descrever o diaconado de transição em termos de aprendizagem centra-se demasiado nos aspectos funcionais do papel, vendo-o apenas como preparação ou formação para o sacerdócio.
Ao reduzir o diaconado transitório a um aprendizado, falhamos em reconhecer plenamente esta graça sacramental como uma verdadeira participação no serviço de Cristo. Tal redução pode levar a uma subvalorização das contribuições únicas e essenciais do diaconado para a Igreja, incluindo os seus papéis na liturgia, na pregação e na caridade, que não são apenas passos em direção ao sacerdócio, mas são manifestações da participação real e permanente do diácono no ministério. de Cristo.
Portanto, embora eu concorde com a crítica de Ditewig à terminologia problemática de "transitório" e "permanente", também é essencial contestar sua caracterização do diaconato transitório como um aprendizado, defendendo, em vez disso, uma apreciação teológica mais profunda do diaconato como uma expressão plena e autêntica do ministério ordenado em seu próprio direito.
Serviço: Essencial para o sacerdócio
Entendido corretamente, o diaconato de transição não é apenas um estágio preparatório para o sacerdócio, mas também uma profunda expressão sacramental de diaconia - "serviço" - que é essencial para o sacerdócio. Esse período deve imbuir os futuros sacerdotes de uma compreensão profundamente enraizada do serviço como uma dimensão fundamental de seu ministério, alinhando-se com a missão de Cristo de servir.
Teologicamente, quando os seminaristas são ordenados como diáconos transitórios, eles passam por uma mudança ontológica, configurando-os a Cristo, o Servo. Essa configuração não é meramente temporária; ela molda permanentemente sua identidade como ministros chamados a servir, influenciando fundamentalmente a maneira como viverão seu sacerdócio.
O serviço aprendido e vivido como diácono não cessa com a ordenação sacerdotal; ao contrário, ele se torna o alicerce por meio do qual o ministério sacerdotal é expresso. Cada ação sacramental e encontro pastoral em que um sacerdote se envolve está profundamente imbuído do espírito de diaconia. O sacerdote se aproxima do altar e dos sacramentos não como um senhor, mas como um servo. Ele oferece o sacrifício da Eucaristia e reconcilia os pecadores não a partir de uma posição de poder, mas de um serviço humilde ao povo de Deus.
Levando Cristo ao mundo
A integração do diaconato ao sacerdócio permite que o sacerdote leve o ministério de Cristo ao mundo de uma maneira que é fundamentalmente marcada pelo serviço. Isso fica evidente na forma como os sacerdotes são chamados a estar com seu povo, compartilhando suas alegrias e tristezas e cuidando de suas necessidades espirituais e, muitas vezes, temporais. Ao realizar atos de caridade, ensinar, aconselhar e liderar, as ações do sacerdote são uma extensão de sua ordenação diaconal. O caráter diaconal, portanto, não diminui; ao contrário, ele aprimora o ministério sacerdotal, permitindo que o sacerdote atue como uma ponte entre a liturgia sagrada e a experiência vivida pelos fiéis.
O caráter sacramental duplo de ser diácono e sacerdote facilita uma abordagem mais holística do cuidado pastoral, em que o sacerdote vê seus deveres ministeriais pela lente do serviço. Essa perspectiva é crucial no contexto atual, em que os fiéis buscam modelos de liderança que estejam em sintonia com a mensagem de amor e humildade de Cristo. Ao viver as dimensões diaconais de seu sacerdócio, os sacerdotes incorporam uma expressão mais autêntica do chamado de Cristo para servir, tornando a Igreja um verdadeiro reflexo da servidão de Cristo. O diaconato transitório é integral, não periférico, à natureza e à eficácia do ministério sacerdotal na Igreja Católica.
Autor: Diácono Dominic Cerrato
Original em inglês: Our Sunday Visitor