O Cristianismo Como A Verdadeira Psicologia

04/02/2025
Blaise Pascal por Augustin Pajou, 1785 [Museu do Louvre, Paris]
Blaise Pascal por Augustin Pajou, 1785 [Museu do Louvre, Paris]

Seria quase impossível exagerar a influência do matemático, físico e apologista cristão francês Blaise Pascal (1623-1662) sobre o cristianismo moderno. Durante sua vida, Pascal foi conhecido principalmente por seu trabalho sobre a matemática da probabilidade e seus experimentos que provavam a realidade do vácuo, além de seus escritos controversos em defesa do jansenismo francês.

No final de sua curta vida, no entanto, Pascal envolveu seus colegas jansenistas e seus amigos "libertinos" descrentes (cujas vidas interiores pareciam provar a realidade de um vácuo espiritual), com os quais ele se sentava por longas horas na mesa de jogo (para fazer uso de sua teoria da probabilidade), argumentando a favor da verdade do cristianismo. Temos evidências desses esforços apenas em um conjunto de anotações encontradas após sua morte.

Os Pensées (Pensamentos) de Pascal, como essas anotações passaram a ser chamadas em sua forma publicada, deram forma ao modo como falamos sobre o cristianismo desde então. Pascal fornece um relato severo, de fato assustador, da condição humana e adapta a antiga sabedoria de Santo Agostinho à sua própria visão do mundo, tudo com o objetivo de induzir todos os seres humanos a buscar Deus.

As anotações de Pascal chegam a 923 fragmentos diferentes, alguns com uma frase, outros com páginas, mas seu argumento pode ser resumido brevemente. O cristianismo ensina, afirma Pascal, que a condição humana é decaída. A razão humana tem dificuldade em conhecer qualquer coisa: nossos poderes racionais são geralmente especializados e limitados e, de qualquer forma, propensos a distorções de vaidade e imaginação. Além disso, somos "desproporcionais" em relação ao universo. O mundo exterior consiste meramente de matéria, mas nós somos compostos de matéria e pensamento. O mundo exterior é um abismo infinito, mas nós somos finitos. O cristianismo ensina que nosso Deus é um Deus oculto. De fato, não podemos vê-lo em lugar algum no vazio infinito do universo.

O comportamento humano oferece mais evidências de nossa queda. Somos dotados da grandeza do pensamento, mas gastamos nossas energias continuamente tentando evitar pensar, para não nos conscientizarmos da vaidade e do vazio de nosso eu interior: "Toda a infelicidade dos homens provém de uma só coisa: de não saber ficar quieto num quarto".

Gostaríamos de ser felizes; gostaríamos de descansar na felicidade. Mas, na verdade, nos mantemos em constante "agitação", desviando-nos do pensamento e enganando-nos com a crença de que esta ou aquela atividade - seja a caça às lebres, o novo empreendimento comercial ou nossa próxima aposta no cassino - finalmente nos permitirá descansar satisfeitos.

Será que nos damos conta de nosso absurdo? Não, nós o repetimos: a imortalidade da alma e a existência de Deus são duas questões de absoluta importância cujas respostas determinariam como devemos viver. Mas a maioria dos seres humanos dá a essas questões apenas uma consideração superficial antes de encolher os ombros e voltar para a roleta.

A razão por si só nos aconselharia a apostar na existência de Deus, mas a razão é uma coisa pequena comparada às profundezas confusas do coração humano. O homem caído desperdiça seus dias com diversões em vez de buscar a verdade sobre o que mais importa.

No cristianismo, a verdadeira fé é um dom de Deus, como Pascal bem sabe. Nós a recebemos em uma graça sobrenatural e não podemos nos apoderar dela pelos esforços naturais da razão. Mas o que a razão pode ver é o seguinte: estamos cercados por um universo infinito, impossível de atravessar.

Até mesmo a coisa mais minúscula - um inseto ou um átomo - é infinitamente divisível matematicamente. Mas ainda há mais um abismo infinito para descobrirmos. Se olharmos para dentro de nós mesmos, descobriremos que um leve "traço" de nossa condição não caída permanece. Esse traço nos diz que já fomos felizes, mas não somos agora. E o buraco espiritual dentro de nós é infinito em tamanho. Somente um ser espiritual infinito pode preenchê-lo. Somente Deus pode nos preencher completamente.

Mais tarde, em Pensées, Pascal fornece uma lista elegante de evidências tipológicas das Escrituras que parecem "provar" a verdade do cristianismo. Mas Pascal estava convencido de que essas coisas poderiam aparecer como provas apenas para aqueles a quem Deus já havia concedido fé. A única coisa que ele acreditava poder demonstrar aos seus amigos libertinos era que o cristianismo era venerável e amável: "Venerável porque conhece bem o homem e amável porque promete o verdadeiro bem".

Em resumo, a única apologética convincente para o cristianismo era o fato de ele ser a verdadeira psicologia. Ele sabe o que o homem é: caído. Ele oferece o que o homem quer: o verdadeiro descanso na felicidade. Ele nos diz para procurar - mas também para esperar.

Todos os argumentos fora do que encontramos na natureza humana são considerados de importância secundária por Pascal, ou são descartados com desprezo. Sobre os chamados argumentos cosmológicos de São Paulo, Dionísio, o Areopagita, e Tomás de Aquino, Pascal diz: "dizer [aos incrédulos] que eles só precisam olhar … o curso da lua e dos planetas, e alegar ter concluído a prova com tal argumento, é dar-lhes motivos para acreditar que as provas de nossa religião são muito fracas".

Sem a graça de Deus, não podemos ver tal ordem inteligível na natureza, assim como não podemos ver nenhum poder profético nas Escrituras, conclui Pascal. A prova do cristianismo está no homem: em seu vazio e em seu desejo.

Os escritores católicos modernos têm frequentemente retornado a Pascal como fonte para suas visões imaginativas. Flannery O'Connor e Walker Percy, por exemplo, nos apresentam andarilhos no vazio existencial, buscando a graça que preencherá suas almas. O fato de suas histórias serem tão convincentes é um sinal de que Pascal estava pelo menos meio certo: O cristianismo é a verdadeira psicologia.

Mas isso não é tudo. O cristianismo também é uma proclamação sobre a origem, a ordem e o destino de todas as coisas. O Papa Bento XVI perguntou certa vez: "Será que não estamos mais interessados no cosmos?" Pascal, pelo menos, não estava em sua época; ele estava muito envolvido em convencer os libertinos psicologicamente perturbados a buscar Deus dentro de si.

Autor: James Matthew Wilson

Original em inglês: The Catholic Thing