Maria E A Verdadeira Humanidade

03/05/2023
A Virgem e o Menino por Albrecht Dürer, 1512 [Museu de Kunsthistorisches, Viena]
A Virgem e o Menino por Albrecht Dürer, 1512 [Museu de Kunsthistorisches, Viena]

Maio e outubro são os meses especiais em que os católicos tradicionalmente honram a Bem-Aventurada Virgem Maria. Nos últimos anos, a piedade Mariana viu uma recuperação do declínio durante as primeiras décadas após o Vaticano II. As razões para o eclipse variaram dos supostos "excessos" da devoção Mariana entre os católicos à sensibilidade ecumênica em relação aos protestantes, de um foco simplista na "cristologia" ao menosprezo das devoções populares como o ópio dos deploráveis católicos. Felizmente, tais argumentos e agendas esfarrapadas parecem estar desaparecendo.

Um tema que acredito permanecer não desenvolvido na teologia Mariana, no entanto, é o papel dela - junto com o próprio Jesus - como um exemplo do que significa ser humano.

Um dos princípios favoritos de São João Paulo II, já encontrado em sua primeira encíclica, Redemptor hominis, era que Jesus Cristo mostra o que realmente significa ser humano: "Cristo Senhor. Cristo, novo Adão, na própria revelação do mistério do Pai e do seu amor, revela o homem a si mesmo e descobre-lhe a sua vocação sublime" (¶ 8 e 10). Essa citação vem diretamente da "Constituição Pastoral sobre a Igreja no Mundo Atual" do Vaticano II, Gaudium et spes (¶ 22).

Observe que a ênfase é colocada na humanidade de Jesus. Sim, Jesus nos revela Deus plenamente. Mas ele também nos revela o homem. João Paulo invocava incansavelmente Cristo como modelo da verdadeira humanidade, da resposta humana no amor ao próprio Amor.

O que permanece relativamente pouco desenvolvido é como essa ideia se aplica a Maria.

Ora, a plenitude da graça em Maria não é dela; ela é a beneficiária da redenção de seu próprio Filho. Dito isto, seus benefícios privilegiados foram tão grandes que ela participou prevenientemente daquela redenção por meio de sua Imaculada Conceição: Maria, concebida sem pecado original.

O Concílio de Calcedônia deixou claro que a natureza humana de Jesus estava intacta, completa, inteira e ativa: o que o ser humano chamado Jesus fez, Ele fez como um homem real. Essa natureza humana não era, como eu acho que Karl Rahner uma vez opinou, apenas para um passeio.

Dito isso, talvez haja algum desequilíbrio persistente em como os católicos entendem a união hipostática (se é que pensam nisso, mesmo que não sob esse termo técnico). Pensando no Deus-homem, às vezes tendemos a acentuar o primeiro elemento.

Por isso é importante conhecer Maria como modelo de humanidade. O problema teórico nem entra em cena.

Maria é o verdadeiro homem (no sentido universal de "humano", o que enlouquece algumas feministas). Ela não é divina (mesmo sendo "Mãe de Deus"). Assim, ela personifica e modela o que é ser, viver e agir como ser humano como Deus planejou que todos nós fôssemos, vivêssemos e agíssemos.

Um título Mariano é a "Nova Eva", porque – em contraste com a primeira mulher – ela viveu uma vida verdadeiramente humana, fiel.

É verdade que as circunstâncias de Maria são únicas: ela está livre de todo pecado, original e atual. Mas isso é único não por causa de Maria, mas por nossa causa. A vida de Maria é como todos nós deveríamos viver. Nossa incapacidade de fazer isso se deve atribuir a nós, não uma falha de projeto em nossa criação. O fato de Deus ter preservado Maria da mancha do pecado foi uma graça especial, mas uma graça que fez dela o que a humanidade foi originalmente projetada para ser.

As pessoas insistem: "Não sou perfeito". Isso é verdade. Mas Deus não nos fez imperfeitos nem se contenta com o que nos tornamos. Maria nos mostra o que é uma vida verdadeiramente humana, livre do peso do pecado e de seus efeitos (a concupiscência).

Que nunca seremos completamente como Maria é simplesmente uma verdade histórica: o homem quebrou o que deveria ser. Uma perna quebrada pode ser restaurada e curada, mas normalmente permanece algum resíduo por ter sido quebrada. Nunca será tão forte quanto uma perna que nunca foi quebrada. Um dente obturado não vai doer, mas esperar que ele tenha todas as qualidades do dente original e intacto seria um milagre que Deus não concedeu.

Apenas dois exemplos de como Maria nos ensina a verdadeira humanidade: a liberdade e o fim de sua vida.

O mundo moderno interpreta mal a liberdade, pensando que ela coloca os humanos em algum ponto "neutro" entre o bem e o mal, sendo a "escolha" o fim da ação livre. Isto é errado. A liberdade é um meio, não um fim. O fim da ação humana é a bondade, não a liberdade. O bem deve ser feito e o mal evitado.

A liberdade torna esse bem meu, mas não torna essa escolha automaticamente boa nem evita a culpa quando usada para escolher o mal. Maria sempre viu a beleza de Deus, nunca o glamour do mal. Isso deu à escolha dela um aspecto único que falta a nós, seduzidos pelo pecado. Mas isso não significa que sua escolha não foi verdadeiramente humana. Indiscutivelmente, nossas escolhas são menos humanas.

Ao definir o dogma da Assunção, o Papa Pio XII falou não da "morte" de Maria, mas "do fim de sua vida terrena" para reconhecer que, seja qual for a maneira como Maria passou desta vida para a eternidade, esse trânsito era diferente da morte como o homem pecador a conhece. A Dormição de Maria foi única, mas isso porque a maneira como o restante de nós humanos morre nunca foi divinamente desejada, "Deus não é o autor da morte". (Sb 1,13) Nesse sentido, a Assunção de Maria é realmente uma espécie de "primícias" da Ressurreição e Ascensão de Cristo e uma antecipação de nossa própria transfiguração no Juízo Final.

O pensamento e a espiritualidade católicos seriam muito enriquecidos recuperando seus aspectos Marianos e sondando a verdade de sua humanidade como forma de compreender quem e o que nós também somos.

Autor: John M. Grondelski

Original em inglês: The Catholic Link