Evangelizar Pelo Belo

25/05/2018

Por Dom Robert Barron - O Bispo Robert Barron é bispo auxiliar da Arquidiocese de Los Angeles e fundador dos ministério católico Word on Fire.

Em sua obra-prima "Reviver o Passado em Brideshead", Evelyn Waugh expõe implicitamente um programa de evangelização que tem particular relevância para o nosso tempo. "Brideshead" refere-se, é claro, a uma grande mansão de propriedade de uma família católica fabulosamente rica na Inglaterra dos anos de 1920. No complexo esquema semiótico do romance de Waugh, a mansão funciona como um símbolo da Igreja Católica, a que São Paulo se referiu como a "noiva de Cristo". A Brideshead chega, a convite de seu amigo Sebastian, Charles Ryder, um estudante de Oxford, devoto das belas artes e agnóstico casual. Charles está impressionado com a majestosa arquitetura de Brideshead e a suntuosidade do seu aparato artístico, que inclui magníficas pinturas e esculturas, bem como uma fonte de delicadeza semelhante a das obras de Bernini e uma capela que é uma profusão de decoração barroca. Viver dentro das muralhas da mansão, pensou Charles, era receber toda uma educação artística. A beleza do lugar seria, para Charles, o ingresso ao belo, atraindo-o sempre.

Ao longo de suas muitas visitas, Charles veio, é claro, a conhecer os habitantes da casa, a família estranha e sedutora de Sebastian. Especialmente por meio da mãe de Sebastian, a aristocrática e católica devota Lady Marchmain, ele se familiarizou com as demandas morais da Igreja Católica, especialmente porque elas pertenciam ao crescente problema de Sebastian com o álcool. Por muitos anos, Charles se juntou a Sebastian na rebelião de seu amigo contra essas restrições, mas com o tempo, ele passou a apreciar sua importância; na verdade sua indispensabilidade. Finalmente, no final da história, aprendemos que Charles, o antigo agnóstico, veio a abraçar o sistema filosófico coerente do catolicismo e a adorar o Senhor Eucarístico que era conservado na bela capela de Brideshead. Muitos anos depois de entrar naquela capela, como um mero esteta, ele se ajoelhou como um crente.

Este resumo breve e totalmente inadequado da narrativa de Waugh pretende simplesmente destacar um ritmo que detém, eu diria, uma evangelização eficaz. A melhor estratégia evangélica é aquela que se move do belo para o bom e, finalmente, para o verdadeiro. Especialmente dentro de nossa matriz cultural, tão dominada pelo relativismo e pela valorização do direito de criar o próprio sistema de significação, começar com a demanda moral ou com a reivindicação da verdade, provavelmente irá criar bloqueios insuperáveis na pessoa que se deseja evangelizar.

(Quem é você para me dizer como se comportar ou em que acreditar? Como você pode ser tão arrogante a ponto de pensar que deveria impor seus padrões de pensamento a mim?) É precisamente por isso que moralizar e intelectualizar são muitas vezes evitados como primeiro passo em relação a persuasão. Mas há algo inofensivo sobre o belo. Basta olhar para o teto da Capela Sistina ou para o Partenon ou a Catedral de Chartres ou o "Guernica" de Picasso; leia a Divina Comédia ou Hamlet ou A Terra Desolada de T. S. Eliot; observe as irmãs de Madre Teresa trabalhando nas favelas de Calcutá ou no balanço no golfe de Rory McIlroy[1] ou nos movimentos de uma bailarina. Todos eles funcionam como uma espécie de alquimia na alma e despertam o desejo de participar, imitar e, finalmente, compartilhar. Hans Urs von Balthasar, um dos grandes defensores da abordagem estética da religião, disse que o belo atrai o espectador, muda-o e depois o envia em missão.

O padrão é mais ou menos o seguinte: primeiro o belo (que maravilha!), depois o bom (quero participar!) e, finalmente, o verdadeiro (agora eu entendo!). Um jovem assiste a um jogo de futebol habilmente jogado, e desperta nele um profundo desejo de jogar tão bem quanto aqueles a quem ele admirava; e então o jogar o jogo real ensina a ele, desde dentro, as regras e os ritmos do futebol. Uma maneira completamente inadequada de atrair uma criança para o mundo do futebol seria começar com uma clarificação das regras ou com um conjunto de exercícios. Em vez disso, mostre-lhe a beleza do futebol, e ele vai querer jogar e, tendo jogado, ele saberá.[2]

O mesmo se aplica, a fortiori, em relação à religião. Eu poderia sugerir que o evangelista comece com a Sainte Chapelle ou a vida de Francisco de Assis ou a História de uma Alma da Pequena Flor, Santa Terezinha, ou A Montanha dos Sete Patamares de Thomas Merton ou o canto gregoriano, ou talvez o melhor de tudo, uma liturgia cuidadosamente executada do Rito Romano. Esses funcionariam da maneira como Brideshead, seduzindo até mesmo o agnóstico mais entediado. Então, o desafio continua, a sedução levaria a um desejo, talvez inicialmente vago, de participar do universo moral que tornou essas expressões artísticas possíveis. E, finalmente, a participação conduziria a uma compreensão verdadeira e experimental dos padrões de pensamento que sustentam esse modo de vida. Primeiro o belo, depois o bom, depois o verdadeiro.

Eu me pergunto se essa abordagem estética cativante poderia ser mais proveitosa em uma cultura pós-moderna, tão instintivamente cética em relação ao dogma, intelectual ou moral.

Original em inglês: Word On Fire


Notas

[1] É um jogador profissional de golfe norte-irlandês. Mais informações aqui.

[2] Tomamos a liberdade de ao invés de manter o esporte citado no original em inglês - beisebol, que é um esporte popular nos EUA - substituir por futebol para melhor apreensão da mensagem do autor do ensaio.