O Problema Não É o Papa

Embora o apresentador exemplifique com fatos ocorridos na Igreja Católica nos EUA, não nos é difícil achar fatos que se encaixem perfeitamente à situação exposta, pois o mesmo acontece em meio às fileiras de fiéis e de instituições católicas no Brasil.
Há uma forte cantilena entre os católicos sobre uma sequência contínua de comentários imprudentes do Papa Francisco. Os comentários são no mínimo confusos e, muitas vezes, contradizem comentários anteriores que ele fez sobre o mesmo tópico. Nenhuma dúvida sobre isso. Até um cego pode ver.
Mas a indústria que está se desenvolvendo em torno deste pensamento é perigosa em diversos níveis. A indústria de "explodir o Papa por suas declarações confusas e contraditórias" é uma indústria perigosa. Em apenas uma linha de raciocínio, considere isto - e isto é apenas um dos perigos.: a noção que se forma na cabeça das pessoas que tudo o que está errado na Igreja pode ser resolvido pelo Papa, qualquer Papa, bastando para isto que seja mandado consertar.
Uma pequena história sobre este ponto: o Papa Bento disse certa vez - para um famoso visitante que estava lá em seu gabinete, pedindo que ele fizesse algo sobre uma situação imprópria - que "minha autoridade termina ali", apontando para a porta do seu gabinete. Em um evento não tão conhecido, foi apresentado ao Papa João Paulo um dossiê sobre um bispo homossexual dos Estados Unidos, por um cardeal americano. O dossiê era extremamente detalhado e longo.
Após folhear algumas páginas, o futuro santo fechou e empurrou o dossiê de volta para o cardeal sentado do outro lado da mesa e disse: "Eu sei tudo sobre este homem. A menos que você possa me mostrar alguma atividade criminosa, eu sou impotente." O cardeal voltou para os EUA e o bispo homossexual permaneceu em sua diocese até sua aposentadoria por idade.
Exatamente o quê o Papa João Paulo queria dizer com isso é algo misterioso. Mas é suficiente dizer que nada disso é tão fácil quanto parece. Quando você frequenta Roma, por um bom tempo, e conversa com outras pessoas que conhecem outras e assim por diante, o quadro a que se chega é bastante claro que - certo ou errado - os papas acreditam ser extremamente limitados em extirpar o mal na Igreja. Talvez as pessoas estejam sussurrando isso em seus ouvidos, para deixá-los apreensivos em dar este passo.... Quem vai saber?
Lembrem-se dos comentários de alguns membros do alto escalão da Cúria que, depois do Papa Bento deu novo avanço à Missa Latina Tradicional, disseram que eles foram pegos totalmente de surpresa pela forte oposição dos bispos do mundo todo. É aí que reside de fato o problema, apesar das entrevistas confusas e comentários do Papa: há uma rebelião nas fileiras dos bispos contra a fé tradicional.
Claro que nem todos, mas um número suficiente que tornar a reforma quase impossível neste momento, pelo menos de uma de forma significativa. Um Papa não pode simplesmente demitir milhares de bispos ao redor mundo. Este problema tornou-se institucionalizado, uma metástase que se espalhou como uma doença horrível ao longo dos últimos cem anos ou mais. É por isso que um outro papa santo, Papa Pio X, não conseguiu detê-la, mesmo tendo tentado.
Ele lutou contra a heresia do Modernismo há cem anos atrás - e que está a todo vapor hoje em dia - e ele falhou. Ele escreveu uma encíclica contra ela, exigiu de seus bispos mundo afora que a extirpasse dos seminários, fez com que praticamente todos os que fossem professores da Fé, em qualquer nível, fizessem um juramento contra a heresia do Modernismo. Em suma, ele fez tudo o que as pessoas de hoje querem ver o Papa fazendo - qualquer papa - e ele não conseguiu nada.
Muitos dos bispos estão em revolta contra a Fé, quer diretamente quer sofrendo com a ilusão que ao tomarem-se mais simpáticos, ao adaptar a Igreja em sua Palavra e na Liturgia, farão com que os problemas desapareçam. Daí que ao se continuar concentrando no Papa Francisco a solução, perde-se completamente o foco, sejam os comentários e preocupações reais ou não.
O problema é um problema local universal, em todos os lugares: um problema de desobediência. Não é o Papa Francisco que está fazendo de conta que não vê as boates gays em paróquias católicas sob o disfarce de "ministério". Não é o Papa Francisco que está dando piscadelas e acenos para o clero homossexual ativo, que os protegem por meio de suas chancelarias, como notoriamente em Nova York, mas em todo o Ocidente. Não é o Papa Francisco que está aplaudindo o apoio de um grupo abertamente homossexual em um desfile dedicado a um santo e, com certeza, não é ele que está liderando o desfile como um Grande Marechal.
Não é o Papa Francisco que está dando acesso ao Instituto Nacional dos Cavaleiros de Colombo que tem católicos traidores em sua composição. Não é o Papa Francisco que agenda ou permite a quase-heréticos um palanque para falar em conferências católicas por todo o país. Não é nenhum Papa Francisco que está nesses conselhos de todas estas Faculdades católicas, convidando os inimigos da Igreja para discursar em formaturas.
A lista é interminável, mas vocês entenderam. O problema que qualquer papa se defronta, defrontou ou irá defrontar no futuro previsível é que não importa o que ele faça ou não faça, o espírito de desobediência e rebelião desenfreada nas fileiras eclesiásticas não leva a lugar algum. O perigo de sempre acusar Roma, sempre dizer que o Papa é um herege, que o Papa é confuso que o Papa é isso, que o Papa é aquilo, é que o Papa não é o problema - ele é apenas um alvo fácil!
Quando corporações como EWTN[1] começam a falar sobre as coisas confusas que Papa está dizendo, a pergunta que precisa ser feita é: onde vocês estiveram todos esses anos, quando centenas de bispos deixaram a Igreja deteriorar e apodrecer na vinha? Quer dizer que agora basta apenas bater no peito como se corajosos fossem, porque sentiram o clima e perceberam que seu público não gosta de alguma coisa do que o Papa diz?
Claro está que não tem havido uma única história falando sobre os milhões de problemas causados por bispos extraviados, iníquos, infiéis, delirantes, maus e rebeldes e - entendam isto muito claramente - eles foram e continuam a ser o problema. Não o Papa. Papas vem e papas vão, mas a desobediência permanece
Mas vocês não vão ouvir uma palavra sobre este ou aquele mau bispo porque o controle das multidões católicas sabe de que lado vem seu sustento. É fácil se sentar do outro lado do Atlântico e apontar erros, declarações confusas, etc., porque o Papa não vai ouvi-los e não vai dar atenção a eles. O mesmo se aplica para os chamados blogs tradicionalistas por aí, que se imaginam os salvadores da Igreja. Caiam na real! Tudo o que o seu derramamento de fel faz é piorar as condições para qualquer limpeza futura da Igreja, porque vocês já criaram e inculcaram uma cultura de suspeição em torno de quem quer que venha a ser o próximo papa.
Mas escrever artigos sobre algum obscuro bispo em alguma diocese de nível B ou C que pune seus padres que querem rezar a Missa Nova voltada para o Oriente não vão lhes render tantos cliques como um título do tipo: "Papa Anticristo: Um Herege Silencioso"
Anos antes das controvérsias em torno do Papa Francisco, antes que ele fosse conhecido em qualquer lugar fora da Argentina, a Church Militant já dizia que o problema na Igreja são os bispos infiéis, os bispos fracos, os bispos carreiristas e os bispos ignorantes. E se o Papa viesse amanhã e dissesse chega de Santa Comunhão na mão! Chega de coroinhas meninas! Chega de hereges falando na Conferência de Educação Religiosa da Arquidiocese de Los Angeles! Chega de cardeais liderando desfiles com gays! Chega da horrível catequese ensinada nas escolas (supondo que ele soubesse alguma coisa sobre isso.)! E se ele chegasse e fizesse tudo isso? Vocês realmente acham que os seus bispos, suas dioceses locais ou as conferências nacionais de bispos católicos em todos os tipos de países, lhe dariam alguma atenção?
Papa Paulo VI veio com um ensinamento verdadeiro sobre controle da natalidade e mandaram ele plantar batatas! E no caso de vocês estarem procurando por uma prova da desobediência deles, lembrem-se da situação da Missa em latim. Eles ignoraram até o último detalhe da vontade expressa do Santo Padre Papa Bento para serem generosos em permiti-la. Quantos seminários hoje nos EUA ensinam a Missa Tridentina aos seus seminaristas? Vocês podem contá-los nos dedos de uma mão.
Se o Papa fizesse e dissesse todas estas coisas, os bispos apenas esperariam ele sair. O reinado médio de um papa não é tão longo. Papa São João Paulo foi uma enorme exceção. A maioria dos papas duram menos de oito anos. Eles iriam formar comitês para "estudar" as instruções. Eles se reuniriam com teólogos para "considerar" as questões. Eles marcariam reuniões e depois iriam adiá-las uma após a outra. E quando eles eventualmente vierem a ter suas reuniões, eles iriam emitir declarações de lixo que a reunião produziu e a necessidade de novas reuniões.
Houve uma grande luta no Vaticano II entre os Bispos e Roma. Os bispos queriam mais espaço para mostrar sua força, queriam se sentir mais no controle, sem a opressão de Roma.
Os bispos ganharam. Eles correram de volta para suas dioceses e exercitaram tanto a sua força que esmagaram a Fé. Como eles não estão dispostos a devolver este controle, então eles fazem política e fingem que estão fazendo isso ou realizando aquilo, mas, na realidade, eles estão executando as coisas do jeito que eles querem, e Roma que se dane.
Quando Bill Clinton concorreu para presidente em 1992, ele sabia de uma coisa e disse uma outra adicionalmente. Ele ganhou porque entendeu que toda a política é de fato local e que o problema era: "É a economia, estúpido".
Bem, todos os problemas na Igreja são locais - e são os bispos. São os bispos. São os bispos.
Atacar o Papa é a saída fácil. O maciço bombardeio à Roma desvia do problema real que são os bispos desobedientes.
Assistam ao vídeo a seguir.
Original em inglês: The Vortex - Church Militant
[1] A Eternal Word Television Network (EWTN) é o maior canal de televisão católico do mundo. Foi fundado pela Madre Angélica (1923-2016) em 1981 e atualmente alcança mais de 80 milhões de lares em 110 países. No Brasil está disponível na Vivo TV.